FORT WAYNE, INDIANA, USA – Semana passada, enquanto eu escrevia o meu artigo publicado nesta coluna, intitulado “Mike Pence: O homem que elegeu Trump e que pode tirar-lo da presidência”, por alguns instantes pensei que talvez eu pudesse soar exagerado ao apresentar um possível cenário em que Trump sofresse um impeachment. Mas hoje, ao final da primeira semana do seu governo, tenho certeza que isto ocorrerá. Na verdade, precisa acontecer.
Trump termina a sua primeira semana tendo assinado ao todo 15 documentos que são ordens executivas, memorandos presidenciais e proclamações. Uma tempestade de informação que ainda não deu tempo para a imprensa mundial assimilar, tampouco digerir o teor dos documentos assinados e suas implicações. Antes mesmo de engrenar a repercussão da ordem de Trump para a construção do muro na fronteira com o México, os holofotes já mudavam para a sua política de imigração, ou antes mesmo de os analistas de relações internacionais iniciarem o primeiro parágrafo de comentário sobre o rompimento das relações com o TPP, já existia demanda de pauta sobre refugiados rejeitados nos aeroportos. A primeira semana de Trump deu trabalho aos jornalistas e comentaristas. Ainda parece que estão todos tontos querendo entender essa “blitzkrieg de maldades” do recém homem mais poderoso do mundo.
O Covarde
O fato de Trump recorrer às ordens executivas (documentos semelhantes à decretos ou medidas provisórias no Brasil – respeitadas as diferenças) para impor suas vontades, revela a postura do poderoso chefão oriundo do mundo dos negócios, que pouco se importa com os efeitos colaterais de suas canetadas. Certamente Trump está acostumado à dar ordens aos funcionários das suas quase 400 empresas e não deve estar nenhum pouco acostumado a ter que negociar ordens com ninguém, se comportando sempre como um Napoleão em saltos altos. O problema é que uma nação não é uma empresa, e nos protocolos naturais da política está a arte da negociação e diálogos com a oposição, para isso, no mundo democrático estabelecemos congressos de legisladores para debaterem entre si determinadas leis e os destinos da nação. Desta forma, para Trump, cada assinatura de ordens executivas, representa uma negociação à menos, e Trump se revela como um covarde com medo da negociação política, com receio de enfraquecer a sua austera imagem, mesmo sabendo que tem a maioria do Congresso.
Mas a constatação de que Trump é um covarde não é nova. Já suspeitávamos disso. A ratificação da sua covardia vai além do fato de temer as negociações políticas. A covardia está expressa no teor das suas políticas, no desdém com as vidas destruídas e famílias separadas com a frieza de sua caneta, no sarcasmo em dizer que o México pagará pelo muro enquanto despreza a cordialidade diplomática com desdém perante a visita que o Presidente mexicano Enrique Pena faria à Washington, no corte de orçamento da ONU, no seu veto ao ingresso aos refugiados e imigrantes nos EUA, no corte de repasses às cidades-santuário, e na retomada da construção do oleoduto sobre as terras indígenas Sioux no estado de Dakota do Norte. Soma-se à essa covardia toda, o fato de fugir dos questionamentos da imprensa e apenas emitir informes através do seu secretário de imprensa durante toda a semana.
O castelo de areia
O mundo inteiro ficou surpreso e chocado com a facilidade com que um único homem sozinho obteve êxito em desfazer políticas-de-Estado e princípios nacionais à toque-de-caixa, motivado por sua única e exclusiva vontade e consciência. Nem o mais douto analista seria capaz de previr que em uma democracia “forte” como os Estados Unidos, instituições sólidas seriam desafiadas e substituídas pela vontade e temperamento de um déspota. As instituições burocráticas, as comissões, o congresso nacional, as agências nacionais, governos estaduais, a classe política e a imprensa, todos foram reféns dos caprichos e ignorância de um único ser presidencial, revelando para o resto do mundo que até o “sagrado” Estados Unidos pode, sim, ser muito vulnerável e volúvel aos devaneios de um louco com uma caneta nas mãos. Até que parecia um país mais sólido, mas o castelo de areia começa a ruir.
Quando nos queixamos que no Brasil não existe política-de-Estado, (que é aquela que visa a continuidade perene e harmônica na construção de algo) ao invés, o que vemos no Brasil são apenas volúveis políticas de governo (que é aquela que é modificada cada vez que um novo partido assume o poder abandonando completamente as políticas do governo anterior); não levamos em consideração que até mesmo os Estados Unidos podem se tornar um país vulnerável e suscetível em elevadíssima potência, à giros de 180 graus em suas execuções políticas dependendo do temperamento do novo governante – dignas de uma republiqueta de bananas.
A decepção da direita
Por um momento durante a campanha presidencial, Trump foi festejado pelo partido republicano como uma alternativa viável ao partido, porém Trump se revelou a maior decepção dos conservadores. As loucuras do déspota já estão trazendo danos à imagem do partido – e de todos os que apoiam o movimento de direita no mundo inteiro. Muitos já estão tentando desatar e desvincular suas imagens do presidente Trump. No Brasil, a direita conservadora já pôs as barbas de molho, pois Trump pode queimar o filme do movimento conservador para as eleições de 2018.
O fato é que cada vez mais Trump se isola do mundo político e se envolve numa bolha com conselheiros familiares, dentre eles seu genro Jared Kushner. O presidente se afasta do jogo político, da imprensa, do debate e assume uma postura autoritária, cultivando uma única palavra certa dentro do partido republicano: decepção. Com um cenário destes, fica fácil prever que Mike Pence é quem terminará o mandato de 4 anos.