Os dois pré-candidatos à indicação do Partido Democrata para as eleições presidenciais dos Estados Unidos, Hillary Clinton e Bernie Sanders, se enfrentaram nesta quinta-feira no debate mais acalorado até o momento da campanha, a cinco dias das eleições primárias em New Hampshire.
A tensão que ficou evidente entre as duas campanhas após o empate técnico em Iowa fez com que o debate de hoje fosse o mais dinâmico até o momento, no qual os dois pré-candidatos trocaram acusações e expuseram às claras suas diferenças ideológicas e programáticas.
“Quero construir sobre a base do progresso que já alcançamos. Acredito na universidade acessível, mas não na universidade gratuita. Os números não nos levam para o quê propõe o senador Sanders, e os especialistas coincidem em afirmar que suas propostas não são factíveis”, disse Hillary logo no início do debate.
Enquanto os pré-candidatos da oposição republicana em geral evitam o assunto, a questão de como controlar as companhias do setor financeiro permanece como uma divergência significativa entre os dois democratas. O desacordo teve um papel central no debate realizado pela MSNBC em Durham, New Hampshire, dias antes da primária neste Estado, marcada para terça-feira.
Sanders, mais à esquerda da rival, quer dividir os maiores bancos dos EUA e diz que eles cresceram demais e se tornaram muito poderosos, representando muitos riscos para a economia em geral. “Na minha visão, o modelo de negócios de Wall Street é a fraude”, disse o senador por Vermont. Recebendo fortes aplausos, ele acrescentou que nenhum dos altos executivos dos maiores bancos foi para a cadeia após a crise financeira “e isso é o que precisa mudar”.
Hillary, ex-secretária de Estado e ex-senadora por Nova York, diz que dividir grandes bancos deve ser um recurso empregado apenas em último caso. Ela também defendeu seu foco no controle dos riscos para além dos grandes bancos, para incluir o chamado sistema bancário paralelo, algo em que as propostas de Sanders toca de forma menos direta. Ela pretende impor controles sobre tomadas e concessões de empréstimo para companhias financeiras que não são bancos, como corretoras e fundos de investimentos.
A ex-secretária de Estado defendeu a reforma da saúde promovida pelo presidente Barack Obama, algo que já “é real” frente à proposta de Sanders de saúde gratuita e universal, que, nas palavras da pré-candidata, seria o mesmo que “recomeçar do zero com algo que não se sabe se funcionará”.
“Quem é a esquerda no Partido Democrata? Segundo a visão de Sanders, nem Obama nem o vice-presidente Joe Biden são progressistas com base nas ideias que defendem”, criticou a ex-primeira-dama, que foi acusada várias vezes por seu rival de manter posicionamentos políticos que não são progressistas em temas como o comércio e a regulamentação do setor bancário.
Sanders, por sua vez, respondeu à ex-secretária de Estado assegurando que se nega “a crer que os Estados Unidos” não podem ter uma saúde como a de outros países, onde esta é “um direito” e onde se gasta “muito menos por cabeça” que nos Estados Unidos.
“Tenho muito orgulho de ser o único candidato aqui em cima que não tem um ‘SuperPAC’ (comitê de ação política), isso é o que se necessita para a revolução política”, disse Sanders, ao aludir ao apoio que parte destes grupos e dos grandes doadores deram a Hillary.
Tal declaração fez com que a ex-secretária de Estado criticasse as “insinuações” de Sanders nas quais “dá por feito que todo o mundo que tenha recebido para fazer palestras está comprado”, em referência a suas conferências em eventos de grandes bancos de Wall Street, pelas quais recebeu centenas de milhares de dólares.
“Já chega. Se tem algo a dizer, então diga. Não acho que seja possível encontrar na política atual alguém que tenha recebido mais ataques por parte das grandes fortunas do que eu”, se queixou a pré-candidata, que assegurou que “as pessoas de Wall Street” estão tentando derrubá-la nesta campanha.
Mesmo assim, e apesar do pedido dos moderadores, a também ex-senadora por Nova York evitou se comprometer a publicar as transcrições de todas as suas palestras contratadas por empresas de Wall Street.
Um dos momentos mais tensos da noite foi quando o senador socialista afirmou que sua rival representa o poder estabelecido e ele os cidadãos comuns.
“(Hillary) Clinton tem o apoio de quase todo o ‘establishment’. (Hillary) Clinton representa o ‘establishment’, eu represento aos cidadãos americanos comuns”, declarou Sanders.
O senador acusou a ex-secretária de Estado de representar a elite ao reagir às palavras que Hillary tinha pronunciado momentos antes, quando a pré-candidata garantiu que sente “orgulho” de receber apoio de muitos políticos no estado de Vermont.
Vermont é o estado que Sanders representa no Senado e no qual desenvolveu toda sua carreira política.
“Gente que trabalhou comigo e com Sanders acaba preferindo me apoiar porque sabe que eu posso conseguir as coisas”, reiterou a ex-primeira-dama, que recriminou o senador por ser “o único” que caracteriza ela, “uma mulher que está tentando chegar à Casa Branca”, como parte do ‘establishment’.